quarta-feira, 19 de setembro de 2007

As várias pétalas da última flor do Lácio

O fenômeno do empréstimo cultural se dá em todas as áreas do fazer e do conhecimento humano, em todos os países. A maneira de se vestir, de comer, de beber, de se divertir, de se transportar, dependem de uma infinidade de produtos e invenções transmitidas e incorporadas de uma cultura a outra.
Este fenômeno também se dá no processo de formação da língua, uma das principais características que definem um grupo cultural. Mas quando uma palavra estrangeira se introduz em uma outra língua, sempre levanta polêmicas e este processo não envolve apenas o aspecto lingüístico, mas também questões culturais e políticas.
Na língua portuguesa os empréstimos culturais vêm de longa data, desde a constituição da própria língua, uma vez que, durante a romanização, houve contato íntimo entre o latim e as línguas das regiões conquistadas. Desse contato ficaram os vestígios da língua de um povo vencido na língua do povo vencedor. O latim culto, por sua vez, já recebia enorme influência do latim vulgar. Foi desta mescla que a língua portuguesa foi tomando corpo.
Segundo um levantamento feito pela Academia Brasileira de Letras, a língua portuguesa tem, atualmente, cerca de 356 mil unidades lexicais. Essas unidades estão dicionarizadas no Vocabulário Ortográfico da Língua Portuguesa.
O português é conhecido como A língua de Camões , por ser a língua de Luís de Camões, autor de Os Lusíadas, A última flor do Lácio, expressão usada no soneto Língua Portuguesa de Olavo Bilac ou ainda A doce língua, utilizada por Miguel de Cervantes.
Hoje, a língua portuguesa é falada por mais de 210 milhões de pessoas, sendo a quinta língua mais falada no mundo e a terceira mais falada no mundo ocidental. Idioma oficial de Portugal e do Brasil, e idioma oficial, em conjunto com outros idiomas, de de Angola, Cabo Verde, Guiné-Bissau, Macau, Moçambique, Guiné Equatorial, São Tomé e Príncipe e Timor-Leste, sendo também falada na antiga Índia Portuguesa (Goa, Damão, Diu e Dadrá e Nagar-Aveli).
Por ser um organismo vivo, a língua foi se formando por influências culturais de vários outros povos, vários idiomas e dialetos, até chegar ao estado conhecido atualmente.
O português contemporâneo compreende vários dialetos e subdialetos, falares e subfalares, muitas vezes bastante distintos, além de dois padrões reconhecidos internacionalmente, o português brasileiro e o português europeu.
Mas as relações políticas, culturais e comerciais com outros países, introduziu e continua introduzindo empréstimos de outras línguas modernas. Assim, incorporaram-se ao português palavras provenientes do francês, como chefe, hotel, jardim, paisagem, vitral e vitrina; do inglês, como futebol, bife, corner, pudim, repórter, sanduíche e piquenique; do italiano, como adágio, alegro, andante, confete, gazeta, macarrão, talharim, piano, mortadela, serenata e salame; do alemão, como valsa, manequim e vermute.
São de origem asiática as palavras azul, bambu, beringela, chá, jangada, leque, laranja, tafetá, tulipa e turbante; de origem africana vêm as palavras angu, batuque, berimbau, cachimbo, engambelar, marimbondo, moleque, quitanda, quitute, samba, senzala e vatapá, dentre tantas outras. No português do Brasil, acrescentam-se ainda inúmeros indianismos.
Dos celtas herdamos palavras como carro, cabana e cerveja. E não é difícil identificar as palavras de origem árabe existentes no nosso idioma por causa da presença do artigo invariável al. Assim, temos alfazema, alfaiate, alfange e azeite e açougue, onde o “l” do artigo foi assimilado pelas consoantes “z” e “c”.

Empréstimos e invasões
A cada dia, termos e expressões são considerados obsoletos e caem em desuso. É o caso das gírias, por exemplo, que têm vida curta e localizada na vida lingüística. Objetos que não se usam mais também desaparecem da fala e da escrita do dia-a-dia, como mata-borrão (utilizado para absorver o excesso de tinta do texto escrito com pena ou caneta tinteiro), completamente desconhecido das novas gerações. Paralelamente, com o avanço da tecnologia, novos termos são incorporados à língua, como homepage, escanear, deletar, entre outras expressões.
A coexistência da língua que cede e da língua que recebe o vocábulo tende a modelar a palavra. Toda importação, no entanto, vem de uma cultura estrangeira e traz consigo valores que interferem e modificam a cultura importadora.
A globalização e a rede internet tem tornado o inglês uma fonte de inúmeros empréstimos, sobretudo nas áreas técnicas, o que demonstra a estreita ligação que o processo de mudança lingüística tem com a história social, política e cultural de um povo.
No caso específico do inglês americano e sua influência na língua portuguesa no Brasil, a interferência da língua e sua influencia ultrapassa a questão técnica.
Palavras como movie, estresse, bus, hamburguer, rock, trade, check in, CDRom, marketing, merchandising, ok, em off passaram a fazer parte do português como se fossem termos insubstituíveis e intraduzíveis.
Os jovens de classe média e alta usam corriqueiramente os anglicismos como fashion, boyzinho (mistura da palavra inglesa boy, com sufixo português), overdose, personnal trainer, personnal stylist, rave, please , play, feeling , top, down, D.J.,V.J., expert, yes e muitos outros perfeitamente dispensáveis.
Em bairros onde se concentram as camadas mais pobres e, consequentemente, menos letradas da população, não é difícil encontrar bares exibindo placas com o termo “X-burgue”, ao invés de cheese-burguer. Em contra partida a camada mais abastada economicamente se vangloria de freqüentar os Shopping centers, ao invés de Centros de compras.
O empréstimo de vocábulos de uma língua à outra é perfeitamente natural, mas não pode tomar o papel de dominação social, política, econômica e cultural, encolhendo e empobrecendo a língua que recebe esta influencia.
Para Nelly Carvalho, professora do Departamente de Letras da Universidade Federal de Pernambuco, “a intromissão exagerada de outra língua apaga as experiências compartilhadas e acumuladas pela comunidade de fala , tornando-as impessoais. A língua materna, no caso brasileiro, o português, seria a última identidade que restará, se as demais forem perdidas”.

links:
língua portuguesa - http://joaoxms.sites.uol.com.br/
última flor do Lácio - http://intervox.nce.ufrj.br/~edpaes/flor.htm
Nelly Carvalho - http://www1.universia.com.br/materia/materia.jsp?materia=8585
acessados em 18/09/07

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